O livro de poemas de Antonio Jadel chegou até mim através do escambo que sempre
busco encontrando companheiros de loucuras literárias no Recanto das Letras.
O livro é repleto de poemas bem cadenciados e traz uma visão
singular e moderna diante do amor, da natureza, dos sonhos, das necessidades
fisiológicas, do tempo e das dúvidas. Como diz em seu primeiro poema, é Deus
que escreve em linhas tortas.
FACE I
Hoje eu quero ter a
vontade única de ser uma “Tarde”,
apenas,
e passar o dia sem
olhar no relógio,
No poema Eu tarde,
o autor quer fugir da sua agenda, não olhar o relógio. Ele retoma este
tema em Relógio cuco.
Enquanto isso, ao
relento, criança relembro:
Na sala da minha tia,
Às 12 horas da meia
noite, piava em arte a opção...
Aparece aqui e ali, em sua poesia, um eu-lírico incomodado com
o tempo.
Tempo, sem tempo por
perda de tempo n’agenda
FACE II
De cara o poeta se refere ao amor:
Amor, decidido num
tribunal ‘multiportas’...
A palavra amor aparece pouco em sua poesia, mas este
sentimento está intrínseco em vários poemas quando o poema mergulha em
sentimentos como a saudade.
Há saudade,
sempre onde a saudade
se-lhe cabe.
Neste mesmo poema, Saudade,
o poema lança mão do concretismo e nos faz ver uma saudade escoando como areia
de uma ampulheta e formando novamente saudade no fundo. Esse movimento da saudade
que nos leva a saudar um certo momento.
FACE III
Segui na contramão do
recomendado
perfilhando meus passos
– sentido inverso
ao risco do que seria
sábio.
O poema Contramão
é como se fosse o eu-lírico de Drummond vivendo o jeito gauche de ser. Mas o poeta segue firme na contramão. Não se sente
perdido e nem encontrado. Ainda que não saiba para onde ir. Tudo é contramão,
afirma. Pois ele sabe fazer o contorno mesmo na estrada sem retorno.
Talvez o poeta queira aí nos ensinar a arte de viver.
FACE IV
Sou eu dentro de mim.
Não estabeleço
conexão.
Em sua série de Poema subsequente-subliminar espalhada ao longo da obra, em um deles o poema se revela fechado ao mundo. O eu-lírico se acha ajustado para si e desajustado para o mundo. Um ser não viável, já que o viável é imperfeito. Um eu que se acomoda dentro de sim.
Vento, assoprado por
dentro
FACE V
escute-me, ó Deus
inda que nada eu te
peça
em preces,
Enquanto Drummond se sente abandonado por Deus, o poeta aqui
roga a Deus que lhe escute, ainda que ele não peça nada. Somos teístas porque
precisamos de algo anterior, exterior e superior a nós para justificar nossas
finitudes. Há uso no mesmo poema Escuta-me da metáfora o joio e o trigo,
segundo o poeta, espalhados no mesmo lugar. Refere-se à guerra, em bélica
plantação. Ele indiretamente pede paz.
FACE VI
—sem nenhum ditado—
—regras sem regras—
— rebelde ao mandado–
— oponente ao Estado—
— discorde de tudo—
Em Filosofia o poeta, conhecedor do direito por formação, entende que diante de gente sem eira nem beira, é preciso ser insurgente. O seu credo é assim, o seu amém é sincero. É como se o poeta estivesse dizendo implicitamente que muito mais vasto que o mundo, é o seu coração.
FACE VII
A carapuça é vestida
de negro véu
belo(a)
que s’esconde na
espreita da sombra
à meia-noite
de um dia que passou
florido & risonho.
Em Isolo-me, como
um poema despedida do leitor, último na obra, o poeta depara com a noite. Sim,
todos nós deparamos com a noite quando se devia calar, mas a “lua deixa a gente
comovido como o diabo”. O poeta luta contra seus desejos. Lembra-se do dia
florido e risonho e chora por agora mergulhar nos desvarios da alma.
DA MESMA SÉRIE: MÁRCIO MUNIZ
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