A BARGANHA
— Não precisava ser assim. Alberto não
merecia morrer. Tudo bem, ele era um fanfarrão, um inútil, imprestável, mas era
meu irmão gêmeo. Envenená-lo foi uma ideia absurda. Vê-lo bebendo seu
vinho preferido enquanto pescávamos naquela noite, recordando nossa infância
pobre no interior de Minas Gerais e aí ele vai caindo para trás apontando as
estrelas no céu que dizia serem nossos pais foi o assassinato mais paradoxal
que cometi. Depois, jogá-lo dentro da represa deu pena.
—
Ah é?
— E aquele mendigo
embriagado na calçada? Ver seus miolos sob os pneus da minha moto foi muito
angustiante. Já não lhe bastava dormir ao relento e ainda tinha que morrer
covardemente assim? Eu mal imagino qual seja o seu nome. E ele certamente mal
imagina o motivo que me levou a esmagá-lo. No dia seguinte li no noticiário em
canto de folha de jornal. Falou-se dele como se fala de um animal morto ao
acaso. Eu não me perdoo por isso.
—
Mas faz parte da nossa barganha. Eu te dou riquezas e proteção e você me dá
mortes.
—
Com Munique foi mais difícil, eu amava de fato aquela mulher. Depois de dois
anos a tendo por amante eu pensava em assumir nosso relacionamento. Desistir
das demais e ficar somente com ela. Ela me acompanhou até aquele bosque para um
piquenique. Eu a estrangulei com as mesmas mãos que tanto acariciei seu corpo
macio. Vê-la arregalando os olhos diante dos meus enquanto sua vida se esvaía
foi frieza demais da minha parte.
—
Ah, agora você tem pena? Agora você se arrepende? Vai lá. Entrega-te para a
justiça dos homens. Você vai ver o que vai acontecer. Trinta e dois
assassinatos sem autoria comprovada e de repente o famoso empresário se
entrega. Que sensacional!
—
Vou sim. Primeiro eu reconheço a paternidade do meu filho que mora em Minas.
Passo toda minha fortuna no nome dele. Depois contrato um bom advogado e no
máximo eu vou ser internado no manicômio e lá viverei o que me resta da vida
lendo os livros que sempre tive vontade de ler.
—
Poxa vida, você pensa em tudo.
—
Fez pacto comigo, aguenta. E só para te informar. Seu filho, que você ainda não
teve coragem para reconhecer, acaba de morrer atropelado por uma carreta
desgovernada perto de Manhuaçu.
PARA VOCÊ QUE ME DEU A HONRA DA SUA LEITURA
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