Três meses se passaram. Marli
e Carlinhos estavam se gostando cada vez mais. A canção que havia nos sussurros
de amor e nas palavras ditas pelos olhos estava cada vez mais afinada. Encontravam-se
todos os finais de semana. Marli voltou a participar mais frequentemente das
missas aos domingos e do grupo de adolescentes. Algumas vezes Carlinhos, com
dezoito anos, foi ao grupo de adolescentes a convite dela. Não se sentia bem,
pensou em entrar em um grupo de jovens.
Os encontros entre eles
eram sempre iguais. Começavam com um oi, ficavam a sós, beijavam-se, abraçavam-se,
despediam-se e ia cada um para a sua casa. Porém, de vez em quando, ela tentava
quebrar a monotonia, desafiava a comodidade e arriscava uma carícia mais
ousada. Nem o beijo no pescoço ele dava. Ela sim, cansada de esperar pela
iniciativa dele, agia. Se a canção ficava cada vez mais afinada, era a ousadia
de Marli que ditava o ritmo. Da parte dele só um brilho nos olhos e a presença
perfumada.
Mais três meses se
passaram. Marli já começava a ficar cansada da monotonia. Era legal ficar com
Carlinhos. Mas dele não vinha nenhuma novidade. Ele sempre era o mesmo. Ela gostava
de acariciar seu peito peludo, de beijar seus lábios carnudos. Mas ele parecia
não gostar e recusava terminantemente acariciar os seus palpitantes de Marli,
roçar suas coxas. Era só alguns beijos e abraços e nada mais.
Em certo sábado, Marli foi
a um aniversário com o grupo de adolescentes. Carlinhos não foi.
Depois da celebração, o
costumeiro comes-e-bebes e o bate-papo para passar o tempo.
Marli reparou que dois
olhos estranhos a ela a acompanhava por onde ela fosse. Tentou fingir que não
tinha percebido. Tentou discretamente estudar o rapaz que não tirava seus olhos
feitos duas jabuticabas de cima dela.
_Até que é bonitinho.
Falou silenciosamente consigo.
_Quem é aquele cara ali?
Perguntou para uma colega do grupo.
_É o primo de Deyse.
Marli chegou a pensar que
era alguma paquerinha de Deyse, pois estava com ela. Agora sabia por quê.
_Já que era só primo, bem,
Flávia não disse que era só primo, mas deve ser só isso pelo jeito. Se fosse
paquera de Deyse não estaria me olhando assim tão descaradamente. Continuou
falando consigo.
Cinco minutos depois se aproximou
de Deyse. Sabia que seria bem acolhida pela moça de blazer vermelho. Ela sempre
fora muito afetuosa e legal. Nas reuniões do grupo era sempre a mais loquaz.
Chegou deixando um sorriso
aflorar nos lábios. Deyse acolheu-a com um “oi Marli” que saiu macio,
deslizando no seu batom. Os olhos de jabuticabas do rapaz ao lado
arregalaram-se.
Ele disse implorando:
_Prima, apresente-me sua
amiguinha.
_Marli, este é o meu
primo. Falou Deyse estendendo o braço em direção ao rapaz.
_Marli, muito prazer. Falou
a recém-chegada esticando o pescoço para receber os lábios do rapaz que tocaram
de leve.
_O meu nome é Juninho. Falou
o de olhos de jabuticabas com calma.
Marli nem percebeu a
retirada de Deyse, deixou-se envolver pelo encantamento dos olhos negros.
_Você mora aqui perto? Procurou
o rapaz esticar assunto.
_Moro, quer dizer, não é
tão perto assim. Uns vinte minutos a pé. E você, onde mora?
_Eu moro no Rio e estou a
passeio aqui em Mutum.
_Já conhecia a nossa
cidade?
_Não. Mamãe é que é daqui.
Ela é irmã da mãe de Deyse.
_Está gostando do passeio?
Perguntou. Marli, antes de ele dizer que era do Rio, já tinha notado seu
sotaque acariocado.
_Poxa, aqui é tranquilo. Estou
gostando a bessa.
Sorriram juntos.
Marli sentiu os dedos do
rapaz preenchendo os espaços vazios entre os seus dedos da mão esquerda. Puxou sua
mão para cima e o rapaz entendeu que aquilo era um “não posso”. Talvez um “aqui
não”.
Cruzou os braços e olhou
nos olhos de Marli que baixou seus olhos para fugir dele. Não resistiu muito
tempo olhando o par de Nike do rapaz. Preferia o seu rosto. Mirou-o bem nas
sobrancelhas e constatou que ele ainda a olhava nos olhos. Olhou para dentro da
sala. Estavam na varandinha que também servia de garagem e viu um pequeno grupo
de colegas seus dançarem ao som de uma música pop. Olhou para a rua e viu um
homem que caminhava cambaleando. Estava bêbado na certa. Olhou para o rapaz e
constatou que ele, Juninho, do Rio de Janeiro, ainda estava fitando seu rosto
redondo. Teve vontade de abraça-lo e beija-lo. Sabia que ali não. O grupo todo
sabia que ela namorava o Carlinhos. Teve vontade de explicar isso para Juninho,
mas faltava ainda um pouco de certeza de saber que realmente ele estava afim
dele, se era verdade aquilo que seus olhos diziam. Podia ser só impressão dela.
Marli resolveu ir embora. Não
exitou em convidar Juninho para lhe acompanhar. Ele não exitou em aceitar o
convite. Saíram os dois. Ela disse que gostava do Roupa Nova. Ele disse que
gostava do Kid Abelha e dos Paralamas.
Ao passarem perto de uma
árvore, foram envolvidos pela sombra. Pararam, olharam um para o outro. Entenderam-se.
Aproximaram-se. Abraçaram-se e se beijaram.
Afastaram um pouco e
suspiraram. Voltaram a se abraçar e a se beijar. Entregaram-se aos desejos do
coração.
Marli reconheceu que não
ficava bem ser vista ali por um conhecido. Agora tinha certeza de que ele
estava afim dela e resolveu falar da existência de Carlinhos.
_Deixe me ir. Falou mansamente.
_Fica mais. Está legal
aqui cm você.
_Não posso. Tenho namorado.
_Ah! Entendi. E tinha
entendido mesmo.
Só mais um beijinho de
leve e se separaram.
Marli chegou a sua casa um
pouco tarde. Já eram dez e meia e sua mãe a esperava vendo filme. O namorado da
irmã já tinha ido embora. Entrou pela sala e antes que a mãe falasse alguma
coisa, beijou-a no rosto.
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