DA SÉRIE: CRÔNICAS ANACRÔNICAS
Cheguei perto da barraca da
moça sorridente e pedi:
_Vê aí para mim um romance.
Ela me perguntou:
_Com drama ou sem drama?
Fui envolvido em uma nuvem
de interrogações. Como assim? Com drama? Sem drama? Que negocio é esse de romance
sem drama?
Vendo minha cara de pastel
de feira, igual aos que estavam sendo fritos na barraca ao lado, explicou em
poucas palavras: _Ultimamente, algumas pessoas foram proibidas de consumir
romances com drama. Segundo os distribuidores de romances, os editores
explicaram que os deputados, pressionados pela bancada da medicina, aprovaram
essa resolução. Produzir romances sem drama.
_E por quê? Onde já se viu
romance sem drama?
_Há pessoas que, devido ao
alto grau de dramaticidade da sua vida, já possui uma grande dose de dramalina
no sangue. Fui um cientista que descobriu essa substância. O normal é ter uma
taxa entre 200 a 400 mg/dL de sangue. Os laboratórios agora estão fazendo esse
exame. O senhor, que é metido a escritor não sabe disso não?
_Depois de agradecer pelo
elogio dirigido a mim de “metido a escritor”, fui sincero, e isso é uma
raridade, disse: _Não. E não tenho a obrigação de saber.
_Mas quem quer ser escritor
precisa está antenado que nem barata na parede.
_Mais uma vez tive que
concordar com a moça.
Voltei para casa, pensativo.
Tem alguma coisa errada. A pessoa acostumada a dramas tem sempre mais
facilidade de entender as tragédias da vida alheia, ainda que fictícias. Pessoa
que nunca teve sufoco na vida, como vai entender um personagem que vive
sufocado na faina do enredo? Quer saber uma coisa? Ela disse que é uma resolução da comissão de
deputados, então é por isso que a coisa está errada.
Mais do que de repente, tive
um insight.
_Está aí, a vida me dando
uma nova oportunidade. Quem sabe eu me dou bem escrevendo romance sem drama
para pessoas com hiperdramalinismo e me realizo financeiramente como escritor,
faturando uns centavos a mais que uma feirante imponente.
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