terça-feira, 15 de outubro de 2024

CAPELA DE SANTA QUITÉRIA: TEMPO E PROCELA

 TEMPO E PROCELA



Compartilho nesta postagem o poema que escrevi para retratar o quadro do artista Argilano Rodrigues Pereira CAPELA DE SANTA QUITÉRIA, convidado por ele para a sua V BIENAL intitulada BIENAL DO FIM DO MUNDO: CORES E POESIA PARA CELEBRAR A VIDA.

O evento aconteceu no dia 28 de setembro, em Iúna-ES, no Cerimonial Doce Infância, bairro Vila Nova. Na oportunidade o artista expôs suas obras e escritores convidados leram seus textos inspirados na larva do artista. 

Eis o poema de minha autoria.

TEMPO E PROCELA

Para aquelas altas catas

De localizações inexatas

Tanto quanto a ambição

Partiram-se os homens

Com diferentes fomes

E entre elas a devoção.

 

Isto em tempos passados

Com corpos escravizados

Em desumana exploração

Pelos senhores de pelejas

Donos de minas e igrejas

Mas não de alma e coração.

 

Mil setecentos e setenta e oito

Nas fadigas do século dezoito

O Sr. Paulo de Araújo Aguiar

Em seu terreno e com ajuda

Elevou uma ermida miúda

Para santificar aquele lugar.

 

Nasceu a edícula tão bela

Dedicada a Santa Quitéria

No seio de Minas Gerais

Protetora, filha de Braga

De portadores de chaga

Nos terrenos emocionais.

 

Vencendo tempo e procela

Segue firme no fim da viela

Na base da serra do caraça

Tendo um cruzeiro ao lado

Da história sendo um legado

E encanta quem por lá passa.

 

Uma orada entre tantas

Quitéria entre as santas

Andou, mesmo decepada

Para morrer tão serena

E ter uma casa pequena

Em cidade tão visitada.

 

Tão minúscula e tão tamanha

Graciosidade que nunca acanha

Quem nela adentra com sua fé

Deprimido ou mordido de cão

Receba de Quitéria a proteção

Como se fosse a xícara de café.

 

Erguida e no decorrer de seis anos

A construção fez parte dos planos

Dos que se uniram em casamento

Mil setecentos e trinta e quatro

É que ocorreu tão sublime fato

Conforme atesta um documento.

 

Mas foi no século II, muito antes

Lá na terra dos daqui dominantes

Que Quitéria disse não ao tálamo

Do corpo sua cabeça foi separada

Ainda assim seguiu sua caminhada

Agora versejada pelo meu cálamo.

 

E o garimpeiro capixaba

Que tem na arte sua cata

Fez de bateia a sua tela

Argilano, em nobre ofício

Nos retratou um paraíso

Na singeleza d’uma capela.



NOTÍCIAS DA BIENAL

 

 






sexta-feira, 13 de setembro de 2024

PENTALOGIA DAS MINHAS PÉTALAS SEMANAIS - XXXI: POENTE, PRAIAS E PORTOS

 POENTE, PRAIAS E PORTOS

IMAGEM: FREEPIK

De volta a postar minhas pétalas semanais em forma de pentalogias.

Trago minha produção de dias de aperto com trabalho e um incômodo na saúde física. Mas tudo bem, são coisas da vida que todo ser orgânico passa.

E não adianta ser uma pedra, pois pedra sempre fica no meio de algum caminho. O incômodo e o aperto moram em nós em algum cômodo em nosso corpo.

 

É sobre a brevidade da vida, do não enquadramento no mundo ou sobre a mente rebelde que insiste em escrever poemas para um mundo cada vez mais ágil e líquido, que versejei esta semana. Confira, e não se fira

 

PÉTALA I

 

POENTE

 

Vago no mundo sem sentido

Sentindo o início de um final

Mente exausta, corpo dorido

Diante do poente paradoxal.

 

Ando um tanto desiludido

Com este meu destino fatal

Eu me acho sempre perdido

Toda tarde sou perca total.

 

Vai ver que sempre foi assim

O homem sempre perto do fim.

 

 

PÉTALA II

 

EM OUTRAS PRAIAS

 

Em nenhum rótulo me enquadro

Acho que sou mesmo quadrado

O mundo inteiro é o meu quarto

Não marcho em nenhum quartel.

 

Em nenhum papel me encaixo

Nem de figurante desfigurado

Em nenhum palco represento

Sequer tenho acento no teatro.

 

Não me importo com ovação ou vaias

Os meus portos ficam em outras praias.

 

 

PÉTALA III

 

DESÉDEN

 

Ela batia roupa no tanque

Ele batia veneno na lavoura

Nada demais para um casal

Em um rincão do meu país

 

Longe dali a cidade é grande

Grande demais para sonhos

Que de tão humanos, únicos

São absorvidos pelo concreto.

 

Enquanto o casal descobria a nudez

A cidade tomava café envenenado.

 

 

PÉTALA IV

 

A MENTE EM SUA REBELDIA

 

Sempre que eu sinto

Perto de ser extinto

Um aperto no peito

Se ajeita no coração.

 

Fere, mas logo passa

Difere da Benta Graça

Amassa e arregaça

E some como fumaça.

 

Sempre que eu pressinto

Que bombas explodirão

Quando beijarem o chão

Sinto-me como soldado

Deslocado do batalhão.

 

Talvez seja algum medo

Como o de morrer cedo

Talvez seja algum credo

Escrevendo seu enredo.

 

Talvez eu escreva uma carta

Para uma tal de Marta

Talvez eu fuja para Marte

Ou aprenda uma arte marcial.

 

Talvez eu conceba um poema

Em plena luz do dia

Talvez seja somente melancolia

Ou a mente em sua rebeldia.

 

 

PÉTALA V

 

NA FICÇÃO

 

Marta, Marta

Se eu te escrevo uma carta

É só por causa da rima

Não por causa da paixão

Marta, Marta

Essa dor que me deixa doido

Quase enfarta o meu coração.

 

E foi aquele anjo torto

Que fingindo de morto

Foi meu porto solidão

E se grito por socorro

Parece mais um arroto

Que qualquer solução.

 

Eu, este homem sério

Por detrás de um bigode

Quero namorar a vida

Mas ela sempre me fode

 

Eu, este homem sério

Sertanejo, cidadão

Entre tantas pernas

Na mesma lotação

Trago um mistério

Dentro de uma missão.

 

É tudo é tão efêmero

Como fêmea na ficção.