(CONTO POLICIAL)
A
sala era bem decorada com quadros pintados das mais variadas cores que nos
transportavam através do tempo e espaço.
O
juiz sentado no sofá escuro olhava cada um como se estivesse no seu tempo de
detetive, procurando uma prova para comprovar o crime e, no papel de juiz
agora, dar a sentença final.
De
repente Margareth aparece na porta com sua bermuda estampada realçando a
superfície abronzeada de suas coxas que sustentavam o resto do corpo moreno
arrematado pelos cabelos castanhos, escovados um pouco antes. O juiz se
espantou com sua presença. Os olhos que até minutos atrás vasculhavam a grama
verde dos quadros passou a vasculhar aquele corpo de um metro e setenta e seis
centímetros, de olhos castanhos claros e lábios carnudos.
—
Boa tarde, Dr. Brandão.
—
Boa tarde, Margareth.
—
Meu pai está no banho, daqui a pouco ele vem falar com o senhor.
—
Está bem, não se preocupe comigo. Estou apreciando a arte desses quadros. —
apontou para as pinturas emolduradas na parede.
Margareth
deu alguns passos e sentou sensualmente no sofá menor enquanto o juiz se
ajeitou melhor no grande sofá, fixando seus sexagenários olhos no bronze
encorpado da garota.
Passaram-se
alguns minutos sem palavra alguma até o juiz quebrar o silêncio.
—
Margareth, você estuda?
—
Não doutor, eu não estudo mais. Eu terminei o ensino médio há dois anos. Sabe,
eu sou um pouco preguiçosa. Acho que não me dou bem com os livros.
—
E com o que você se dá bem?
—
Sei lá. Talvez com os amigos.
As
últimas palavras de Margareth foram misturadas com o barulho dos passos da
serviçal entrando na sala com a bandeja de café destinada ao juiz.
—
Aqui está. — disse a moça cordialmente e depois virou, tomando o rumo da
cozinha com seus dezessete anos de idade, ainda concluindo o ensino fundamental,
à noite.
Margareth
sentiu uma vontade irresistível te acompanha-la, imaginou a moça à beira da
máquina de lavar roupas com aquelas duas coxas brancas. Vagou pela sua mente um
desejo sútil e proibido. Seus olhos começaram a brilhar.
O
juiz, pressionando o couro do sofá com suas nádegas enquanto deliciava-se com o
café fresquinho, percebeu a mudança de expressão no rosto de Margareth com sua
experiência de tantos anos observando reações de investigados e réus, perguntou
a ela o que havia acontecido.
Margareth
não soube responder, resmungou alguma coisa incompreensível, pediu licença e
foi para o seu quarto.
Ao
sair da sala, ela esbarrou com seu pai que já estava chegando para fazer sala
ao sexagenário senhor de fala e gestos meticulosos.
Chegando
a seu quarto, deitou-se sobre o colchão que sempre fora testemunha das suas
angústias. O novo ambiente em nada ajudou a apagar a imaginação libidinosa. Ao
contrário, passou a lhe dar mais subsídios para elaborar em sua mente situações
e êxtases. Margareth repousou sua cabeça sobre o travesseiro depois de desistir
frear a sanha imaginativa. Deixou que agora ela corresse solta e seu pensamento
a levou diversas vezes à cozinha onde encontrava Lucinha na pia com seus pares
de coxas brancas e a mesma saia de brim desbotado.
O
fim da tarde foi torturante. O desejo de possuir Lucinha não a abandonava.
Arriscaria quando a noite chegasse. A moça chegava sempre pelas dez e meia do
seu curso de supletivo, entrava no quarto reservado para serviçais. Ela iria
lá. Encontraria a moça no banho ou vestindo-se. Momento perfeito para ao menos
observa o resto do seu corpo, quem sabe, desnudo.
As
horas se arrastavam pelos relógios. Enfim ela ouviu os passos de Lucinha
chegando no horário de sempre. Esperou um pouco para ter coragem e para que a
moça se ajeitasse em seu pequeno quarto. Desceu com seu pijaminha curto.
Precisava de um pretexto. Confiou na sua criatividade. Aproximou e percebeu que
havia outra pessoa no quarto junto com a serviçal. Curiosa, olhou pela
fechadura e viu seu pai acariciando o corpo branco da moça. Uma fúria irrompeu
em sua mente. Precisava controlar-se. Sua paixão era de horas atrás e não
conhecida por ninguém. Deu vontade de bater na porta. Inventar um pretexto para
interromper o momento íntimo dos dois. Como não percebera antes a relação do
pai com a empregada. Não se perdoaria pela desilusão que se permitiu ter, e nem
perdoaria o pai por não ter respeito com a mãe, esposa que ele dizia que tanto
amava, porém falecida há oito anos.
No
dia seguinte, Margareth acordou com a cabeça doendo e uma dúvida latejando sem
cessar. Como encarar seu pai e o fruto do seu desejo repentino e ao mesmo
tempo, uma desilusão tão sucinta. Contou até três e resolveu encarar a
realidade. Nunca sentira nada por garota nenhuma, aquele sentimento deveria ser
carência afetiva. Havia meses que não paquerava ninguém. Mas a atitude do pai
era imperdoável. Quando chegou à cozinha, nenhum sinal de Lucinha. Foi até à
porta do quarto serviçal, parecia entreaberta. Por curiosidade empurrou. Levou a
mão à boca. O corpo branco que desejara no dia anterior e vira nos braços do
seu pai estava inerte. O sangue escorrera manchando o lençol. Lucinha havia
sido assassinada.
Lembrou
que o pai havia comentado sobre uma viagem que faria bem cedo. O advogado
precisava ir até Manhuaçu acompanhar um caso. Ligou para a polícia.
Dr.
Ramos assumiu o caso. O astuto detetive quis ouvir Margareth. Ela tentou
esconder alguns fatos, mas expôs o pai.
O
pai disse que não dera conta do assassinato devido à pressa em sair cedo. Como a
serviçal estudava à noite, costumava por a mesa do café depois das sete da
manhã. Como ele precisava sair cedo, fez o desjejum matinal na padaria da
esquina.
Dois
dias após o assassinato, Dr. Ramos e Dr. Brandão estavam frente a frente no escritório
do juiz.
—
Dr. Ramos, sei da sua reputação. Aprecio seu trabalho de investigador.
Acredite, o consideramos o melhor detetive da Zona da Mata Mineira. Sua fama
vai de Juiz de Fora a Governador Valadares. Acredito que já tenha chegado ao
Rio de Janeiro. Gostaria de lhe confidenciar algo, e fica no campo da fofoca e
do segredo. Não estou na condição de depoente, gostaria de lhe dizer que estive
na casa do Dr. Almeida na tarde que antecedeu a noite do assassinato de
Lucinha. Notei o olhar lascivo da senhorita Margareth lançado sobre a serviçal.
É um detalhe Dr. Ramos que deve ser levado em consideração.
—
Certamente levarei, meritíssimo. Todo detalhe é relevante para chegarmos ao
momento de um assassinato e esclarecer quem esteve lá e qual a motivação que o
levou a estar lá. Ou quem tinha interesse na morte da vítima.
Três
dias depois Dr. Ramos retorna ao escritório do juiz.
—
Dr. Brandão, eu vim lhe agradecer o detalhe que o senhor me passou há três
dias. Ele foi importantíssimo para a elucidação do caso. Eu ainda não sei
observar as reações de um réu, não sou juiz. Mas eu sei como o senhor que já
foi detetive, observar as reações de um investigado. Conclui que o senhor é um
homem da lei, gosta de ciências humanas e odeia matemática.
—
Não estou entendendo, como o senhor sabe que eu não gosto de matemática?
—
O senhor não gosta de triângulos, sobretudo dos triângulos amorosos. Devido ao
relacionamento sexual entre o senhor e o Dr. Almeida, o senhor era o único de
fora daquela casa que tinha a chave da porta de entrada. Lucinha estava
roubando o seu amante. Por isso o senhor eliminou um dos vértices do triângulo.
—
Não vou dizer que o senhor está certo, pois na nossa justiça o certo pode ser
errado e o errado pode ser certo. Vou tentar me safar dessa com meus
conhecimentos. Vou acompanhá-lo até a delegacia para prestar meu depoimento.
—
Então vamos.
DA SÉRIE: Dr. RAMOS
OBS: CONTO AINDA SUJEITO A CORREÇÕES.
MAIS DE Dr. RAMOS EM:
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